atualizado em 08/03/2005
Estroma
hematopoiético medular e o sistema hematopoiético em mielodisplasias e
neoplasias
As doenças mieloproliferativas são essencialmente distúrbios
relativos à transformação neoplásica de um clone celular do sistema
hematopoiético. Embora as células hematopoiéticas neoplásicas exibam vantagens
de crescimento adquiridas através de alterações genéticas, elas permanecem
sensíveis aos sinais advindos do ambiente hematopoiético, tanto solúveis quanto
mediados por contatos intercelulares ou matriz extracelular. Simultaneamente, a
análise clonogênica de células transformadas mostra que as células leucêmicas
seguem a estrutura hierárquica geral do sistema hematopoiético, e que somente os
precursores mais imaturos mantêm o clone leucêmico. Com a exceção de células
presentes na crise blástica terminal, a maior parte de células leucêmicas não
são clonogênicas. Portanto, a organização do estroma medular terá efeito
profundo sobre a evolução da doença, assim como a presença de células malignas
modificará o próprio estroma. Essa interação bidirecional pode ser resumida em
três situações:
a)
Ambiente hematopoiético modificado por processo neoplásico
b)
Ambiente hematopoiético maligno
c)
Ambiente
hematopoiético indutor da neoplásia
O foco dessa nova linha de pesquisa projeto dirige-se essencialmente
à terceira situação descrita, proponde que o
ambiente hematopoiético medular
seja o indutor primário da neoplasia.
Uma série de resultados experimentais preliminares mostrou que os modelos in
vitro podem permitir uma análise celular e molecular dos estromas
conjuntivos derivados dos pacientes com doenças mieloproliferativas e da sua
interação com o sistema hematopoiético.
Para evitar a interferência de células derivadas do sistema
hematopoiético próprio (macrófagos, mastócitos, células NK, linfócitos),
descendentes dos clones geneticamente alterados e portanto potencialmente
envolvidas no processo neoplásico, estudamos culturas de populações homogêneas
de células conjuntivas medulares. Observações de vários grupos indicaram que
essas células, representativas de miofibroblastos medulares, possuem a
capacidade de sustentar in vitro a mielo- e a linfopoiese. Estudos
preliminares nos mostraram que:
-
A dinâmica da proliferação das células
conjuntivas medulares é diferente nas amostras colhidas de doadores normais,
quando comparada com os estromas de pacientes com mielodisplasias e leucemias.
Esses parâmetros são intrínsecos das populações estromais, sendo mantidos
indefinidamente ao longo de cultivo in vitro em condições padronizadas.
-
A capacidade do estroma conjuntivo de sustentar
a hematopoiese in vitro a partir de células normais, isoladas do sangue
de cordão umbilical, é amplamente divergente entre os estromas normais e
patológicos, repetindo freqüentemente o padrão da displasia observada in vivo.
Espelhando o quadro hematopoiético do paciente, os estromas obtidos de pacientes
com mielodisplasias ou leucemias favorecem a proliferação de blastos e
precursores mielóides e retardam a sua diferenciação.
-
As modificações observadas são reversíveis, já
que os blastos transferidos para uma cultura de estroma conjuntivo medular
normal revertem o fenótipo patológico, e terminam normalmente a sua
diferenciação.
As observações relatadas levantam as seguintes questões e hipóteses
de trabalho. A premissa inicial é que a população celular do estroma obtida de
portadores de patologias mieloproliferativas é funcionalmente diferente da
normal. Essa diferença se mantém in vitro, em condições padronizadas
de cultura celular, durante numerosas gerações. Trata-se portanto de uma
propriedade intrínseca da população celular estudada, e não de uma indução por
mediadores pro-inflamatórios, ou por presença de células malignas. A
manutenção dessa anormalidade ao longo do cultivo in vitro sugere:
-
uma modificação genética (incluindo uma
eventual infeção viral),
-
uma seleção de subpopulações particulares de
células estromais a partir do estoque comum “normal” durante o processo
patológico, ou
-
uma modificação funcional inicial, induzida
in vivo pelo processo neoplásico, mantida in vitro na população por
um “loop” autócrino de citocinas, moléculas de comunicação intercelular, ou
elementos da matriz extracelular que perpetuam o comportamento modificado da
população celular estudada.
Estudos preliminares mostraram que a interação via junções
comunicantes no estroma de pacientes com neoplasias hematológicas sofre
alterações quando comparada com a medula normal. Em vista da observação citada
acima mostrando que a expressão das conexinas correlaciona-se com a proliferação
e diferenciação celular, investimos no estudo de junções e a sua função nos
controles da proliferação e apoptose de células da medula óssea de pacientes com
doenças mieloproliferativas.
Essa nova linha de pesquisa está sendo desenvolvida em colaboração
com o grupo da Professora Maria Mitzi Brentani da Faculdade de Medina da USP e
Dr. Luis Fernado reis do Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer, São Paulo.
Paralelamente, estudamos a interação entre os estroma
hematopoiético medular e as micrometástases carcinomatosas. Essa linha de
trabalho responde à necessidade de monitoramento da presença da doença residual
no material coletado da medula óssea, ou de células do sangue periférico
colhidas por leucoaferese após a mobilização de células hematopoiéticas,
utilizadas para o transplante autólogo em tratamento dos pacientes portadores de
carcinomas, principalmente do câncer de mama. Por um lado, necessitamos
estabelecer os métodos de identificação de células carcinomatosas no material
colhido. Por outro, compreender o significado da presença de células
carcinomatosas para o prognóstico da evolução da doença e para a escolha da
conduta médica adequada.
Esse estudo levanta as questões seguintes:
-
quais as causas da disseminação freqüente de
células cancerosas isoladas para o estroma hematopoiético,
-
quais as causas da supressão do crescimento
rápido de células cancerosas nesse sítio,
-
qual a relevância das micrometástases medulares
para a disseminação posterior do câncer, e
-
qual a freqüência da saída dessas células para
tecidos onde poderão readquirir a capacidade de crescimento agressivo ?
Resultados preliminares mostram que a detecção de células
carcinomatosas pode ser feita por métodos moleculares (RT-PCR),
correlacionado-se com o grau de agressividade do carcinoma. O valor prognóstico
para o comportamento da doença frente ao tratamento específico, e para a
evolução da doença está sendo estudado num projeto de longa duração.
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